Costumes de rua


Eu costumo ser muito observadora dos costumes das pessoas. Gosto de olhar o que fazem, como fazem, etc. Posso analisar isso de forma errada, a final são as minhas percepções, mas fica registrado (ainda que por um curto tempo) na memória o que presenciei.

Bom, nessas andanças de vida, existem coisas que são muito diferentes entre MEUS costumes e os costumes dos chilenos (generalizando).
Por exemplo, imaginem a situação em que estou na rua, apressada, procurando um endereço que não sei bem onde está.

MODO LIGIA DE AGIR:
*da uma olhadinha pra primeira pessoa que passe e abordar:
- Oi, posso te fazer uma pergunta?
- Sim.
- Onde fica a rua Merced com Mac Iver?
- blablablabla
- Ok, obrigada.


MODO CHILENO DE AGIR:
* da uma analisada completa na rua, olha desesperadamente sem saber a quem perguntar, procura uma barraquinha de revista ou doces.
- Oi
- Oi
- Bom dia.
- Bom dia.
- Como está?
- Bem, obrigado.
- Desculpa incomodar, mas posso te fazer uma pergunta?
- Anham.
- Sabe, é que eu estou atrasado porque vou para uma entrevista de trabalho. Eu estou sem trabalhar há um mês e preciso muito do emprego e agora consegui uma oportunidade.
- Anham
- Eu to um pouco perdido, não consigo achar a rua, voce pode me ajudar?
- Anham
- Aqui ta escrito Mac Iver com Merced. É isso mesmo?
- Anham
- Não sei bem se é para a direita ou esquerda essa rua.
- Pra direita
- Voce tem certeza que é pra la?
- Anham
- Pra lá né? (apontando)
- Anham
- Ah, muito obrigada, viu. Voce foi muito gentil. Que tenha um lindo dia e obrigada
- ok


Bom, deve ser por isso que as pessoas são muito secas pra responder quando a gente pergunta coisas nas ruas de Santiago... tem que ter muito amor no coração mesmo...

Voltando

Esse fim de semana tentarei com todas minhas forças voltar a escrever nesse diário. Farei um esforço de elefante para isso.

Muitas vezes ao dia tenho vontade de escrever coisas, mas a preguiça é maior. Absurdo isso para minha profissão, para minha paixão.

Aguardem...

Efeitos

Por qualquer razao que a psicologia certamente me ajudaria a entender, eu ainda tenho vontade de chorar cada vez que lembro do dia 27 de fevereiro.

A gente finge ser forte, finge que tá tudo bem, continua a vida normal, mas ela segue em frente. Mas la dentro parece que a marca nao vai desaparecer.

Cada vez que alguma coisa me faz lembrar daquela noite em que acordei assustada, me vem uma vontade grande de chorar. A lembranca do barulho das pedras caindo do lado de fora, da sensacao de que a vida nao passaria daquele minuto, das pessoas gritando quando sai na rua, do desespero de todos, das imagens na tv... essa lembranca parece que nao vou conseguir apagar com minha má memória.

Apesar de que o que eu tenha vivido aqui em Santiago nao seja nada perto do que viveram as pessoas nas cidades mais afetadas, eu sei que la no fundo do meu baú pessoal, sempre vou ter guardada uma cartinha que comeca com "27 de fevereiro de 2010, 3:00hrs. Santiago de Chile.

Talvez o vídeo a seguir mostre um pouco do que milhares de pessoas viveram ao mesmo momento que eu:


Dias depois do terremoto, não tenho duvidas de que os jornalistas no Brasil não deveria somente ser obrigados a ter um diploma (coisa que já não necessitam ter), como também passar um longo treinamento de ética, responsabilidade e humanidade.

Parece que falta muito para o jornalista brasileiro ser eficiente e capacitado para a tarefa diária que recebe nos jornais impressos, revistas e televisão.

Hoje, vivendo a realidade de uma tragédia humana bem de perto e acompanhando as noticias no Chile, Argentina, Espanha e Brasil, vejo que falta muito para os profissionais de comunicação social no Brasil serem considerados éticos.

Vi muitas pessoas serem entrevistadas, entre meus amigos alguns, como eu, participaram de entrevistas virtuais para jornais, sites e televisão. Vergonha.
Não faltaram os erros de digitação, a falta de informação do jornalista, a publicação de dados falsos, os erros geográficos, a omissão, a mentira, a não compreensão do que se falava.
Conheço pessoas com histórias trocadas, idades trocadas, cidades natal trocadas, relatos trocados, mentira mentira mentira. Onde está a verdade jornalística? Onde está nossa Federação Nacional dos Jornalistas?
Não existe mais necessidade de verdade para colocar uma matéria no ar? Não existe investigação previa e pos-entrevista?
O que está acontecendo conosco?

Tive a sorte de ser entrevistada por um meio de comunicação que colocou meu relato na integra, sem trocar uma virgula. Agradeço ao jornalista Bruno Constante pela oportunidade que me deu em falar e por ter sido honesto comigo: http://mtv.uol.com.br/noticias/tremor-saiba-o-que-aconteceu-no-chile

Diferente de outros colegas nossos de profissão que não pensaram duas vezes antes de inventar historias para publicar.

Faço novamente um apelo: IMPRENSA BRASILEIRA, PAREM DE FAZER SENSACIONALISMO COM O QUE ESTÁ ACONTECENDO NO MUNDO. Utilizem o espaço que vocês tem para as coisas reais. Sacar sangue de nós não é tudo o que gera audiência. Sejam mais fiéis a nossa profissão. Estou decepcionada.

Liberdade de expressão não significa comunicar as historias da própria cabeça.

Merda, ta tremendo


"Merda, ta tremendo", foi uma das primeiras coisas que veio na minha cabeca quando tudo comecou.
Às 3h30 da madrugada acordei sentindo tremer minha cama. Minha cachorra, Kate, estava agitada. Eu pensei: "Ah, ta tremendo, vou voltar a dormir".
Aqui no Chile é muito comum que hajam pequenos tremores de terra, que duram poucos segundos e nao assusta muito as pessoas. Eu ja me acostei a acordar de madrugada com isso e aprendi a nao dar muita atencao porque em dois ou tres segundos tudo volta ao normal.

"Merda, ta tremendo", foi a segunda coisa que passou pela cabeca. Abracei a Kate e fiquei sentada na cama por alguns segundos. A coisa continuou, o barulho de pedras caindo do lado de fora me fez saltar e ficar parada debaixo da porta do banheiro.

Em algum momento haviam me falado que numa situacao de terremoto, temos que ficar parados embaixo da marquiza de uma porta. Foi o que eu fiz abracada a cachorrinha que nao parava de latir, chorar e tremer.

Olhos fixos no nada, coracao acelerado, vontade de chorar. Nao se pensa muito nessa hora. Sao muitas emocoes ao mesmo tempo.

Estava com meu pijama rosa claro, pensei: "Por sorte dormi vestida hoje".
Quando a terra parou, nao tinha idéia do que fazer, para onde ir, pra quem ligar. Ia saindo de pijama para perguntar ao porteiro o que eu deveria fazer.

Abri a porta e vi as pessoas descendo pelas escadas.
"Ok Lígia, pensa". Fechei a porta, abri o armario, tudo escuro. Peguei a primeira roupa que tinha por ali, vesti por cima do pijama. Abri a porta novamente.

"Ok Lígia, tranquila, voce tem que estar tranquila, pensa primeiro e age depois". Voltei. Peguei um cartao de credito e o documento chileno, abracei a Kate e agora sim, saímos.

No saguao do predio estavam muitas pessoas. Eu nao tinha ideia do que deveria fazer, para onde ir, onde me esconder. Queria gritar, chorar, ligar pra minha família. Nao podia acordar meus pais numa madrugada e dizer: "Oi pai, oi mae, to aqui num terremoto, ta super emocionante e eu amo voces".

Olhava pros lados e nenhuma luz. O celular nao funcionava, queria saber se meus amigos estavam bem. Por fim consigo falar com uma amiga.

"Oi ta tudo bem? - Ta tudo bem, so nao sei o que fazer. - Ah vai pra rua, fica ai, vem replica disso, vai tremer de novo"
Pouts, obrigada amiga, voce me deixou bem tranquila.

Ok, proxima chamada para um chileno:
"Oi, como voce ta? - Com medo, nao sei o que fazer. - Puxa Lígia, fica tranquila, la em Valparaiso..."

Puta que pariu... o que passa com essas pessoas? eu nao queria saber as notícias nacionais e nem que viria outro tremor, estava em PANICO e tentando, sozinha, me tranquilizar.

Por fim, uma amiga que mora ha uma quadra me chamou e passei a noite com ela na esquina, a espera de nao sei o que.

Às 8h voltei pra minha casa, entre medo e vontade de dormir, comer, fazer xixi, chorar. Escolhi dormir e ver depois o que fazer.

Deitei, fechei os olhos e advinha? Voltou a tremer. Bem leve dessa vez, mas eu pulei da cama e ja tava na porta de sapato, mochila e Kate na mao.

Alguns minutos depois voltei a dormir, entre um telefonema e outro. Nao conseguia falar com minha família. Queria dizer que eu estava bem antes que eles vissem as notícias.

Infelizmente nao deu tempo. Quando finalmente falei com meu pai, ele ja sabia do que tinha acontecido e vários amigos tinham ligado para eles em busca de informacoes sobre mim.

Por último, porque agora tenho que ir organizar a casa e ver meus amigos daqui, quero dizer a todos que os AMO muito, estou bem, a cidade nao está tao afetada, mas obviamente PASSAMOS POR UM TERREMOTO. Eu ainda estou assustada, com o coracao acelerado, tentando manter a calma, mas o mais importante disso tudo é que estou viva, estou bem e agora tenho forcas para ir ver a situacao dos outros e ajudar no que puder.

Obrigada a todos pelo carinho. Nesse momento, ter amigos e amor é a melhor coisa que podemos ter.



Estou trabalhando como assistente de marketing e vendas. Meu trabalho de conclusão de curso não foi adiante, nem irá, fica pra 2010 outra vez. Mudei de casa, agora com um apartamento para mim e Kate. Meu pai está no Chile.

Sim, MEU PAI ESTÁ NO CHILE. Sim, eu estou gritando com vocês.

Como estou trabalhando, fui ao Brasil somente para passar o natal com a minha família. Momento único e que, outra vez, me encheu de energia. Na volta, domingo passado, seu Jao decidiu que queria vir comigo.

É uma mistura de surpresa, alegria, nervosismo, esperança. Imaginávamos, toda a família, que ele nunca viajaria de avião, seja para qualquer lugar do planeta. Para mim, a responsabilidade de estar ao seu lado e saber o que fazer em uma situação de emergência, era de muita pressão para pouco conhecimento.

E contrariando todas as previsões, durante todo o trajeto entre minha casa no Brasil e minha casa no Chile, ele se comportou super bem e não sentiu nada mais além de uma dor de cabeça durante o vôo.

Hoje, três dias depois, ele já fala em querer voltar, em deixar algumas coisas para vir e ficar mais tempo, em querer conhecer a cidade com calma, etc. Se eu soubesse que seria tão fácil, não tinha ficado apreensiva durante toda a segunda-feira, quando não consegui comer, dormir, trabalhar... uff papai, ta sendo tudo melhor do que o imaginado.

Ainda faltam quatro dias para que ele volte ao Brasil, ao pensar nisso já vem um pouco de melancolia. Sempre disse que para que o Chile fosse perfeito, só faltaria minha família vir morar aqui. Ter meu pai comigo por alguns dias é ter a esperança de que esse meu sonho possa se realizar.

Renasci




Desde marco, quando voltei das férias no Brasil, minha vida foi dando voltas atrás de voltas. Mudanças que, no momento em que aconteceram, não eram tão significativas, mas que depois percebi que me fizeram “enlouquecer”.

O fim de um relacionamento, a ruptura de uma rotina que eu já estava adaptada, a busca de uma nova moradia, de trabalho, a mudança dos companheiros de universidade, a chegada da Kate, o fim da carreira, o encontro de trabalho, a descoberta de outros brasileiros, a troca de um escritório pelas montanhas da cordilheira, o encontro de um novo amor, o fim da era Valle Nevado, o momento para os amigos na noite de Santiago, o inicio do trabalho de conclusão de curso, a chamada para um emprego estruturado, a solta das amarras de um amor platônico, a saudade da família e amigos, ups, colapsei!

Na semana passada foi o bum de toda a loucura pela qual passei em nove meses de vida. Finalmente nasci!

Foi uma semana complicada, alias, o ultimo mês foi bem complicado para mim. Com a entrega do trabalho de conclusão eu enlouqueci, fugi o máximo que pude dos amigos e me meti de cara no que tinha que fazer. Trabalhei ate das 19h30, chegava em casa quase 21h e ficava acordada ate as 2h, para acordar as 7h e ir trabalhar. Meus olhos fundos e negros identificavam que algo não estava certo com essa rotina de uma hora pra outra.

Assim, sexta-feira me decidi definitivamente sair de tudo isso e fugir da depressão em que me meti em tão pouco tempo. Excelente decisão. Fugi dos amigos, da família, de Santiago, dos problemas, das soluções, das dores e dos amores. Ontem, terça-feira eu já estava 100% Lígia Ferreira outra vez.

Algo que falar

Tenho muita coisa boa para contar, desde que junho minha vida mudou em 99%.
Mas nesse momento, muita tristeza. Pela segunda vez.
Indecisao. Saudade. Cansaco. Idéias. Ideais. Amores. Desamores.
Sao algumas das palavras que me explicam nesse momento. Quero voltar para os bracos de minha pátria, mas nao sem antes concluir minha meta.

Ver mi Aviso

Shared via AddThis

Enlouquecendo

Depois de três meses trabalhando no Valle Nevado, me enfiam sozinha numa sala fechada, silenciosa e quentinha para realizar um trabalho por telefone.
Juro que vou enlouquecer (risos nervosos).
Terceiro dia de trabalho e as costas doem, o sono aperta, a pernas se agitam. Estou numa "dança das cadeiras" sem fim. Por sorte a sala tem janelas grandes que dão vista para... outros prédios...
Definitivamente, será difícil me acostumar com essa rotina de novo, mas estou me esforçando enquanto tomo meu quinto café do dia e olho para a construção de... outro prédio... logo ali do lado.

Adeus inverno

Diferente do que acontece no Brasil, aqui no Chile as estações do ano são bem determinadas e terminam e começam exatamente quando têm que terminar e começar.

No Brasil observamos a diferença somente entre verão e inverno, nossa primavera e outono não existem como aprendemos nos livros escolares: as flores não florescem na primavera e as folhas não caem no outono. Tudo o que sabemos é que no meio no ano faz “frio” e que em todos os outros meses, teremos calor.

Já aqui no Chile as estações são lindamente distintas. É lindo no outono ver folhas secas pelo chão e as arvores completamente “peladas”, da mesma forma como na primavera as flores estão gritando com suas cores por todos os lados. E seria demasiado falar em verão e inverno, são os verdadeiros opostos em tudo.

Hoje termina o inverno. Ainda estou trabalhando no Valle Nevado e já faz uma semana que percebi a diferença entre as duas estações. O que antes era somente frio, agora já amanhece com um sol agradável de primavera que passa o dia aquecendo o quanto pode.

Essa é minha última semana aqui há três mil metros de altura. A um princípio eu estava contente, porque depois de três meses eu já não suportava mais olhar para a neve e sentir frio, não ter sol.

Mas nestes últimos dias, olhar para a montanha branca com esse céu azul e o sol se esforçando para nem derreter a neve e nem nos deixar com frio, poxa, não tenho como não sentir umas borboletas dentro do meu peito.

Eu quero muito voltar para Santiago, porque adoro morar nessa cidade e receber toda a loucura diária que ela me proporciona. Mas nestes momentos de semi-despedida, acho que sentirei falta também da tranqüilidade de se viver na montanha, dos amigos que fiz, das pessoas que conheci, de tudo o que vi e vivi.

Hoje termina o inverno. Daqui quatro dias termina minha temporada nesse paraíso quase natural. Chegarei em Santiago em uma época em que as árvores estarão verdes e floridas. Feliz. Passei três meses maravilhosos aqui encima e sei que passarei outros tantos la embaixo.

Quando cheguei ao Valle Nevado tudo era novidade e meus olhos brilhavam por estar presenciando tantas alegrias. Os dias passaram e eu deixei de me apaixonar pelas coisas. Agora, como um encanto, aqui estou eu maravilhada de novo. Cada época com seus momentos únicos, com paisagens únicas, a cada dia havia uma novidade.

Que feliz sou por poder viver tudo isso. Que presente recebi. Quantas alegrias esse mundo ainda pode me brindar?

Para os brasileiros de plantão



Só duas frases do comentarista chileno no meio do jogo de ontem:

"Chile está dominando o jogo com Brasil"

"Ai vem Valdívia, que provoca PANICO em Brasil”

Essas entre muitas outras besteiras faladas durante o jogo. Ele é versão chilena do nosso amigo Galvão Bueno.

E hoje vou ser obrigada a escutar e ler a todo o momento que Chile jogou um lindo partido, que estava melhor que Brasil, que são superiores (ohohoho). Mas no final, qual é a finalidade do futebol mesmo? Até onde eu me lembre é fazer mais gols e ganhar o jogo, a competição.

Felicitações a seleção brasileira que, apesar de todas as críticas que recebe desde sua primeira formação para a Copa 2010, tem feito ótimos partidos e ganhado muitos. Estamos invictos a 11 jogos consecutivos, assim que...

“llora llora llora”...



A Kate está apaixonada

Minha cachorra, que tem o elegante nome de Kate, é curiosamente apaixonada pelo gato do andar de cima, um gato grande e sem nome que fica olhando incansavelmente para ela.

Enquanto ele fica ali, parado na grama olhando pra dentro da minha varanda, a Kate fica desesperada, chorando, fazendo malabarismos e tentando chamar a atenção dele.

Ontem eu decidi ter uma conversa séria com ela. Já não dava mais para suportar o drama dela em amá-lo tanto e a indiferença dele para tudo isso.

“Kate, vem aqui, vamos conversar.
Você precisa entender que faça o que fizer, ele sempre vai ser diferente de você.
Ele não nasceu para ser seu par.
Ele gosta de liberdade, não ta nem ai pra ter dono, vive na rua.
Olha pra ele agora! Ta lá parado na grama, nesse frio, só te provocando pra ver o seu sofrimento.
Ele nunca vai falar a mesma língua que você.
Ele vai prometer vir te ver e não virá.
Ele vai dizer que vai mudar, mas nunca mudará.
Ele diz que não tem outras, mas lá do outro lado da rua ta cheio de gatas esperando por ele.
Ele fica ai fingindo que escuta o que você fala, mas a verdade é que ele não ta nem aí pro que você diz, ele não pode te entender.
Esse seu desespero, tentando chamar a atenção dele pro ser tão lindo que você é, nunca vai fazer diferença pra ele.
Ele ta ali parado porque quer se sentir amado por alguém, porque precisa disso pro ego dele.
Minha amada Kate, o fato é que você precisa arrumar um cachorro pra se apaixonar.
Esse gato nunca vai ser nada além de um passatempo.
Hoje ele está aqui, amanhã ele vai pra longe e te esquecerá”

Bom, com essa conversa eu espero que ela volte a ser a cachorrinha alegre dentro de casa e esqueça esse gato. Um lindo yorkshire vai aparecer na vida dela.

Uma música para a Kate: Is this love



Admiracao pelo glacê branco

Segunda o dia estava lindo, um sol quentinho e gostoso, já não nevava mais, o céu azul de um azul pintado a lápis de cor. A montanha completamente branca, inteira, era como andar nas nuvens, como dizia minha mãe há dois anos... Deus realmente é muito maravilhoso em criar coisas tão lindas e diferentes nos lugares do mundo.

Minha boca na segunda já quase não existia, de tanto vento gelado que tocou, puras escamas.

Mas o dia começou maravilhosamente bem. Ao sair do alojamento eu achei ter visto pela primeira vez uma aurora boreal. Minha amiga Mayra, ao ver a foto, também pensou o mesmo, mas lendo depois sobre a aurora boreal, percebi que na verdade não foi ela quem eu vi, mas sim algum jogo de luzes e cores que a combinação de neve+sol+atmosfera criou. (leiam algo sobre aurora boreal em: Aurora Boreal). Acredito que uma aurora boreal seja muito mais magnífico do que o que eu vi.

Fiquei muito tempo admirando toda a paisagem a minha volta. Tudo era lindo. Estou apaixonada pela neve, por essa vida, por todas as coisas que Deus tem me proporcionado.

Cheguei ao trabalho e fui confirmar minha decida naquele dia, já que no dia seguinte eu teria que trabalhar na universidade. Me informaram que somente ao meio dia teriam a resposta se o caminho para Valle Nevado estaria liberado, já que o risco da neve descer ainda existia, então por seguranca não estavam permitindo o transito.

Fiquei assustada, eu teria que estar em Santiago no dia seguinte. Pouco tempo depois minha chefa passou por ali e falou que o caminho estava fechado. Acho que olhei pra ela tão desesperada que possivelmente lhe deu pena. Ela disse que ia ver como eu desceria.

Passaram algumas poucas horas, ela voltou e disse: LIGIA, PEGA SUAS COISAS AGORA, FECHA O SEU CAIXA QUE VOCE VAI DESCER DE HELICOPTERO AGORA.
Eu: vou descer de quê??????

As outras meninas riram... eu não sabia se ficava feliz ou com medo... Decidi ficar feliz...

Do dia em que eu vi a neve cair



No domingo, meu segundo dia, acordei junto com as meninas do quarto (durmo com outras três meninas, uma delas brasileira). Estava nevando forte! Com vento... nevando MUITO. Pus toda a roupa que eu podia colocar e muitas meias, na verdade não sabia como me comportar para essa situação.

Andar na neve até o lugar onde tomamos café da manhã foi emocionante, eu não conseguia parar de sorrir. As meninas me olhavam impressionadas, para elas aquilo é normal, para mim, momento único que provavelmente vou viver muitas vezes nos próximos meses trabalhando la. Mas ali era a primeira vez que eu via neve caindo do céu e ficando grudada na minha cabeça, roupa, corpo. Que momento lindo.

Lembrei da primeira vez em que havia estado na Cordilheira dos Andes andando na neve. Agosto de 2007, quando estive no Chile com a minha mãe. Lembro que ouvir minha mãe me dizer: “Isso aqui parece o céu, é como estar no céu, tudo branquinho”.
Lembrei do quanto fiquei emocionada em todo o caminho, por ver paisagens que eu jurava que nunca veria.

Naquele domingo a vista era toda branca, não se via muita coisa, o horizonte desapareceu, só neve por todos os lados. O que antes estava só no chão, pelas montanhas, agora já subia até a altura da canela... O telhado dos hotéis branquinho, a neve caindo... eu estava contente em viver isso.

O dia foi passando e nevou muito, com muito vento, vento forte, dentro da loja escutava o barulho do lado de fora e a neve sendo jogada de um lado pro outro... Aqueles floquinhos brancos caindo. Lindos, mas também assustadores. Cena de filme que eu achei que nunca veria em vivo.
(Vejam o video: De dentro da Escola)

Terminou o dia e continuava nevando muito, nos avisaram que naquele momento não seria possível voltar pro alojamento, a quantidade de neve que caiu já estava muito alta em algumas áreas e não dava pra passar se não tivesse experiência. Decidimos esperar antes de descer pros nossos quartos.

Nevava, a gente escorregava no gelo porque os sapatos não são apropriados, eu já estava com os pés todo molhados novamente... os meninos se jogavam na neve, era divertido, se jogavam e afundavam ate o chão, sumiam...

Fomos pra sala de jogos e ficamos por ali jogando conversa fora até que o pessoal da prevenção de riscos veio pedir a todos que voltassem para os seus quartos. Já era possível fazer isso e que dali por diante a nevasca só pioraria.

Nos abrigamos com o que tínhamos nesse momento, nos juntamos e descemos juntos como a recomendação do pessoal. Eu estava maravilhada, não conseguia sentir medo porque era tudo muito lindo pra mim, estava apreensiva, mas não com medo. Ver tanta neve por todos lados era emocionantemente bom.

Lindo lindo lindo! Não da pra descrever minha emoção em viver tudo isso, eu estava muito feliz.

Eu, a inadaptada

Estava relendo algumas partes do livro "A Sangue Frio" de Truman Capote. Li esse livro no ano passado para fazer uma prova na faculdade. Então a leitura não foi muito prazerosa, porque não gosto de ler livros por obrigação.
Bom, estes dias folheava o livro e encontrei um pequeno “poema” que me descreve como nunca! Vejam:

"Existe uma raça de homens inadaptados
Homens que não podem parar nem estabelecer-se
Homens que destroçam o coração de quem se acerque a ele
Que vagam pelo mundo a esmo
Percorrem a terra, remontam os rios, escalam as cumes mas altas
Levam em si a maldição do sangue cigano
E não sabem o que quer dizer descansar
Se não se movessem de uma mesma senda chegariam longe
Fortes são, valentes e sinceros
Mas acabam cansando-se de todas as coisa
E só adoram o diferente e o novo."


Sempre me sinto assim. Com vontade de coisas novas, me canso rapidamente do que virou rotina, do que vejo todos os dias. Estou sempre em busca de novidades.
Isso é muito cansativo, quando estou me estabilizando, rapidamente mudo de opinião e quero algo inovador pra mim, algo que me de mais emoção, energia.

Agora aqui estou eu, em busca de possibilidades para 2010. Dois anos no Chile parece que serão suficientes, devo ir em busca de outros horizontes.



Conhecendo coisas...

Meu primeiro dia na neve foi muito tranqüilo, minha chefa me apresentou os espaços mais necessários para naqueles primeiros momentos e depois fui conhecer minhas companheiras de trabalho. Algumas já trabalham no inverno há anos, passam de um centro de ski a outro, de um país para outro, em busca de neve, trabalho e dinheiro.

No final daquele dia eu não sabia o que fazer, minhas coisas estavam no quarto da gerente e eu não conhecia nada nem ninguém. Então acompanhei as meninas novas a dar uma volta pelo complexo turístico. Fazia muito frio e eu estava com os pés molhados por andar na neve com tênis normal.

Conhecemos algumas coisas e depois fomos pro alojamento que parece um campo de concentração de guerra, são quatro blocos de alojamento, com dois andares cada um. O primeiro é para os chefes de departamentos, onde os quartos são para no máximo três pessoas e existe um banheiro privado. O segundo, onde eu dormirei, são para os funcionários e professores de ski, o banheiro é compartido para cada dois quartos, onde quatro pessoas dormem em cada. O terceiro é para as mulheres temporárias e estagiárias, os quartos são para quatro pessoas e o banheiro é como em uma academia, compartido entre todos do andar. O último é igual ao terceiro, porém somente para homens.

Pra passar o tempo subimos para uma sala de jogos que os funcionários podem usar. Brincamos um pouco de pimbolim, vimos televisão, fizemos amizade. Não tinha muito o que fazer. Finalmente busquei minhas coisas e fui dormir, super cansada. Começava a nevar naquela noite, mas muito fininho, meu coração acelerou...

Esse final de semana subi para trabalhar no Valle Nevado. Ai vai um resumo das alegrias que vivi em tão pouco tempo:

Me ligaram na tarde de sexta-feira avisando que eu deveria subir as 20h desse mesmo dia e não no sábado pela manha como estava programado. Um professor de ski passaria para me buscar e assim eu não precisaria subir com o ônibus que leva todos os funcionários pra lá.

A gerente do setor onde to trabalhando, Myrian, sempre me atendeu com muita boa vontade, por isso me deu a opção de subir segura com um professor do que ir pela manha de sábado com o ônibus.

O problema é que eu não tinha nada arrumado. Estava planejando arrumar minhas coisas na sexta à noite. Saí do trabalho às 18h e corri no centro de Santiago pra ver se encontrava um tênis impermeável, porque era a única coisa que eu imaginava precisar realmente comprar, o resto já tinha, era só arrumar.

Rodei varias lojas e só encontrava tênis pra homem. O machismo aqui chega ao máximo, mulher não tem direito a praticar esporte que não seja caminhada e hidroginástica. Nas lojas de material esportivo só tinham sapatos especiais para homens, nada para mulher... preconceito no limite da tolerância!!!

Bom, sem opção voltei pra casa e coloquei na maleta o que achei q iria precisar: meia calça, blusa de frio, remédios, toca, luva, óculos, etc... a maleta era pequena, como passaria só dois dias la encima, não enfiei muita coisa.

Antes de sair de casa me deu um medo, uma vontade de não ir, pensava que as pessoas já estavam todas la encima e eu ia chegar sem conhecer ninguém, ser mal recebida, enfim, deu medo tonto de algo novo...

Cheguei ao precioso Valle Nevado as 23h30... me disseram que eu passaria muito mal no primeiro dia, pela mudança de temperatura e pela altitude. Mas eu não senti nada.

O professor que me levou, Max, um senhor que há 17 anos faz aulas de ski, foi muito simpático, conversou comigo o tempo todo e foi me explicando como funcionavam as coisas.

Ele me levou até o quarto onde eu deveria dormir, mas já tinham ocupado as camas. Começamos a procurar a chefe da loja pra saber onde eu dormiria. A maioria das pessoas já estava dormindo a essa hora e ele não sabia em que quarto ela estava. Aliás, ninguém sabia... liguei pra Myrian e ela disse: VEM PRO MEU QUARTO AGORA, O MAX SABE ONDE É, VOCE DORME AQUI COMIGO.

Então, na sexta dormi no hotel do Valle Nevado, no quarto da Myrian, que é como um pequeno apartamento, com cozinha, sala, tudo... agradeci muito a ela e fomos dormir, já era tarde.

Esses foram meus primeiros passos a 3.000 metros de altura.

O número 14

"Se falamos para as pessoas adultas: "Vimos uma casa linda com piso rosa, com flores nas janelas e pombas no telhado", nunca conseguirao imaginar como é essa casa. É necessário dizer: "Vimos uma casa que vale cem mil pesos"." - O Pequeno Príncipe

E eu vi um apartamento longe, com grandes janelas, uma sala espacosa, uma cozinha ventilada, um jardim bonito e lindos quadros em suas paredes. Imaginei meus amigos, minha cachorrinha, minha família. Todos juntos nas antigas cadeiras que decoram o lugar. O Pequeno Príncipe tem razao: voces nunca serao capazes de ver o quanto minha nova casa é linda. Nossa nova casa.



Quando cheguei os olhos se encontraram por alguns instantes. Não havia muito público para atrapalhar, mas os poucos outros pares de olhos que ai estavam eram suficientes para nos deixar incomodados com a situação.

O distanciamento momentâneo, por vergonha ou medo do que poderia acontecer, e a grande aproximação posterior, por desejo ou vontade de saber o que aconteceria, não foram sinais satisfatórios para os dois, que não notaram o quanto cada um tomava rumos diferentes.

O coração acelera forte até agora. Vejo aquele rosto marcante em muitos rostos pela rua. Sinto o cheiro como se ainda estivesse seu perfume na minha pele depois de uma noite intensa. E aqueles olhos que me viram quando eu cheguei numa tarde de domingo, parecem estar me olhando dia e noite. E tudo o que eu quero é voltar a vê-los diante de mim me dizendo coisas que as palavras não sabem traduzir.

Enquanto isso, as palavras me explicam coisas diferentes do que eu li dentro dele. Sua essência me educava para algo atraente, mas ele não foi capaz ou não quis arriscar sua falsa liberdade em troca de outros bons momentos como os que vivemos nesse curto espaço de tempo.

Fica o gosto de “quero mais”, porque eu ainda quero mais de ti.
Fica a vontade de continuar sendo surpreendida pelos seus sentimentos diários.
Fica a tentativa de não te deixar passar “como água correndo entre os dedos”, mas você sozinho já correu das minhas mãos.

Certo dia li que você queria me fazer feliz e que gostaria que eu pudesse te fazer feliz. Eu acreditei que você desejava que fosse assim por muito tempo. Mas sei que ainda posso realizar seu desejo se você deixar.