Diferente do que algumas pessoas pensam, no Chile também faz calor e dias ensolarados de verão. Vez ou outra eu recebo um email de alguém me perguntando se aqui faz calor em alguma época do ano por aqui, claro que sim. Não, não chamem isso de ignorância, não sei exatamente de onde veio o mito, mas muitas pessoas realmente acham que do lado de cá da cordilheira só tem neve e inverno.

Mas as coisas não são bem assim. Agora, por exemplo, estamos na primavera e a temperatura está em torno de 26° durante o dia. Hoje estamos na média de 30°. O céu lá fora está azul celeste (se é que é válida a redundância) e o clima, para mim, agradabilíssimo.

A noite esfria um pouco, mas continua um calorzinho suportável. A sensação térmica daqui é diferente, o ar é muito seco, então pele, cabelos e organismo reclamam rapidamente e necessitam de socorros artificiais (ainda que a igreja católica considere isso pecado). Cremes hidratantes, protetor labial, protetor solar, hidratação capilar e outras maravilhas modernas são obrigatórias e em maior quantidade do que no Brasil.

Discutindo agora com uma colega sobre os benefícios ou malefícios do calor santiaguino, cheguei a conclusão de que eu amo muito tudo isso. Sim, os 30° me fazem respirar aliviada, porque no inverno eu sofri delicadamente em pequenas quantidades diárias.
Eu levantava com muita preguiça, não queria tirar o pijama e menos ainda sair da cama quentinha. Tinha que usar milhares de roupas e acessórios para poder sair de casa, tinha medo de tomar banho e sentia raiva ao voltar da faculdade as 23h com um vento gelado na cara.

Haviam dias em que eu saía de casa com duas meias calças, calça jeans, três ou quatro blusas de lã mais um agasalho mais grosso, gorro e cachecol, além de luvas e botas. Imaginem o bonequinho de neve em que eu me transformava! Para tomar banho eu quase chorava, as vezes levava o aquecedor pra dentro do banheiro e esperava estar tudo mais aconchegante para poder tomar banho.

Lembro que antes de vir para cá eu ficava fantasiando como os chilenos faziam para entrar debaixo do chuveiro. Juro que era uma coisa irreal para mim. Eu não conseguia me imaginar tirando a roupa quentinha e entrando na água, principalmente porque ainda que esteja calor eu fico com frio quando vou entrar na ducha. Foi ai que aprendi “técnicas ninjas”, como essa de colocar o calefator pra esquentar o banheiro primeiro.

Pra sair de casa era todo um ritual para colocar toda essa roupa e na hora de voltar da faculdade eu queria morrer ou viver bem do ladinho do prédio para não ter que andar quadras e mais quadras com um vento congelando o moco que saía do meu nariz.

Em algum momento meu irmão havia me dito que a imagem do inferno para ele era um local gelado, sombrio, triste. Parece que ele tem um pouco de razão. Essa historia de que o inferno é quente é coisa da igreja que não quer que desfrutemos dos prazeres da vida.

“Aqui tá um calor infernal esta semana, imagina o q será deste verão, o mundo está acabando mesmo, mas eu gosto assim, pra mim o inferno não é como pintam, quente, é sim muito frio, é neve, é gelo, frio trás doença, é sombrio, triste, solitário, as pessoas tomam menos banho e usam um milhão de roupa, no verão é alegria, churrasco, praia, pelado, muita água, comida, festa e pouca roupa. O inferno fica no inverno, esquimó são almas penadas, são pessoas que foram más em outras vidas e nascem no pólo norte ou na antártica pra pagar os pecados, iglu é a tradução perfeita da caverna do diabo, os leões marinhos, pingüins, focas, ursos polares, lobos siberianos, tigres alpinos e outros foram coisas ruins em outras gerações!” – Licinio Cesar (vulgo “meu irmão”).

Agora que o frio passou eu estou realmente mais feliz. Me da vontade de estar sempre na rua (ainda que eu não tenha companhia para isso já que ta todo mundo horrorizado com o calor que faz la fora). O dia está sempre lindo, excelente para fotografar e ficar na rua batendo papo. As noites são um pouco mais estreladas e eu posso sair rapidamente de casa e voltar a qualquer hora sem congelar meu corpo. Também amo tomar banho agora e a água está sempre numa temperatura agradável (antes eu nunca conseguia achar ela quente o bastante para me satisfazer).

Enfim, venham para o Chile agora, não há neve para esquiar ou fazer bonequinhos, mas o clima está ótimo, as pessoas estão mais soltas nas ruas, os sorrisos e rodas de conversas são mais constantes e a cerveja é finalmente servida geladinha como manda a tradição.

E disso tudo eu so quero uma coisinha mais: uma piscina plástica na frente de casa ou uma praia a 20min.

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